Evolução
Fui rocha em tempo, e fui no mundo antigo
tronco ou ramo na incógnita floresta...
Onda, espumei, quebrando-me na aresta
Do granito, antiquíssimo inimigo...
Rugi, fera talvez, buscando abrigo
Na caverna que ensombra urze e giesta;
O, monstro primitivo, ergui a testa
No limoso paúl, glauco pascigo...
Hoje sou homem, e na sombra enorme
Vejo, a meus pés, a escada multiforme,
Que desce, em espirais, da imensidade...
Interrogo o infinito e às vezes choro...
Mas estendendo as mãos no vácuo, adoro
E aspiro unicamente à liberdade.
Antero de Quental, in "Sonetos"
Lógica
Um dia, enlouquecida,
A prosa lógica
Quis tornar-se poesia...
Cansou-se de preconceitos e receios,
E de encontrar defeitos de ortografia
Nos mais ingénuos dias
E na melodia das belas canções de outrora...
Pela imperfeição proibida das horas
Cansou-se de contar o tempo
E de explicar o sentimento...
Agora usa uma métrica lúdica e assimétrica
Em metáforas melódicas e histéricas...
De meras palavras concretas e éticas
Virou imagens aladas e secretas
E voou para longe do papel impresso
Para longe da palidez austera do sucesso
Para alvura do enlace das idéias
Para a avidez insensata do pensamento
Onde na mais ilógica filosofia
Nasce um puro movimento... a alma da poesia.
Samantha Beduschi Santana [adaptado]
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